Pague, que nós controlamos

Pus-me à procura dos artigos que fui lendo ao longo do tempo para perceber como tínhamos chegado até aqui.
Obviamente chegámos porque estava tudo a olhar para o lado, mesmo aqueles que nós elegemos para zelar pelos nossos interesses.

Este é um artigo do Público datado de 28.8.2008 quando Cavaco Silva promulgou o diploma que autoriza o Governo a legislar sobre esta matéria.

O Presidente da República, Cavaco Silva, fez acompanhar a promulgação do decreto sobre o “chip” electrónico em automóveis por uma mensagem onde considera que "as dúvidas quanto à limitação à reserva de intimidade da vida privada dos cidadãos que o novo mecanismo de identificação e detecção electrónica de veículos suscita, e que não foram dissipadas durante o debate parlamentar, poderão ser resolvidas pelo Governo no decreto-lei a aprovar ao abrigo da autorização contida na lei agora promulgada".


Um deputado do CDS levanta algumas reservas acerca da obrigatoriedade do chip mas o resultado foi a aprovação do diploma "aprovado a 18 de Julho com os votos favoráveis da maioria socialista e contra de toda a oposição."

De acordo com o Governo, o chip ou dispositivo electrónico de matrículas pretende facilitar o trabalho das forças de segurança, que terão acesso à informação sobre a inspecção periódica e o seguro automóvel. O chip vai permitir, igualmente, o reconhecimento de veículos acidentados e abandonados, além de poder vir a ser utilizado de forma integrada na cobrança de portagens e outras taxas rodoviárias. Cada chip vai custar cerca de dez euros e as despesas ficam a cargo do condutor. 

Claro que o  Governo como desconhece em absoluto a existência de livrete, comprovativo do seguro e comprovativo de inspecções periódicas acha que o chip é a forma de verificar tudo isto. Não podia ser mais idiota esta explicação. O livrete tem de acompanhar o veículo, os outros dois comprovativos têm de estar afixados no pára brisas do veículo mas mesmo assim o chip é fundamental. Pergunto-me como é que os atrasados dos franceses, espanhóis, alemães e demais países da Europa conseguem viver com o facto de ninguém saber nada acerca destes "pequenos detalhes" de todos os veículos que viajam nas suas estradas.

Se isto não fosse tão triste e tão potencialmente grave era de rebentar a rir.
Obviamente que esta bela obra foi resultado da defunta maioria absoluta em que o Governo fez gato sapato de todo o povo português.

Obviamente seria criado mais um organismo empresarial para gerir isto. Mas reparem no pormenor:

O chip vai permitir, igualmente, o reconhecimento de veículos acidentados e abandonados, além de poder vir a ser utilizado de forma integrada na cobrança de portagens e outras taxas rodoviárias.


Ou seja, quando muito bem lhes apetecer instituem uma taxa qualquer e como já todos têm o belo do chip, é só cobrar.
Imaginem que amanhã a autarquia onde vocês vivem decide cobrar portagens numa área qualquer da vossa cidade.
É que nem precisam de se ralar. Avisam que a partir do dia tal passam a cobrar, "espetam" lá com os pórticos ou mesmo com umas antenas discretas e o débito em conta começa a acontecer.
Fabuloso. Etiquetada a carneirada é uma alegria sem igual.

Mas há mais detalhes interessantes:

A empresa que desenvolveu o chip foi criada em Abril de 2008 (como que por milagre aparece 4 meses antes da promulgação) e vejam lá:

A DailyWork é uma 'start up' [empresa criada recentemente e de pequena dimensão] da Brisa "100 por cento portuguesa", que tem uma parceria com a empresa de Aveiro Micro IO e com um professor do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL).

Artigo completo em : Portuguesa DailyWork desenvolveu chip de matrícula e está pronta para concurso

Não é uma questão de concurso (muito menos internacional) nem nada que se pareça. A Brisa faz uma "parceria" que em vez de ser uma Via Verde para usar no limite das suas concessões é alargado por Decreto Lei a TODOS os cidadãos que possuam um veiculo, mesmo que nunca usem uma estrada concessionada à Brisa.
Isto é juntar o negócio do século em termos de mercado potencial à forma de controlo mais despudorada que se podia pensar.
Claro que isto só é possível com o beneplácito do governo e duma AR completamente acéfala com disciplina de voto e com um leque de instituições que não fazem absolutamente nada perante uma coisa destas.
BTW, os cidadãos também não fazem nada até chegar a altura de pagar.

E quem controla toda esta informação?
"O Conselho de Ministro aprovou, igualmente, o decreto-lei que constitui a sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos "SIEV, Sistema de Identificação Electrónica de Veículos, S. A.", atribuindo-lhe o exclusivo da exploração e gestão do sistema de identificação electrónica de veículos".

Quem é o SIEV?
Aqui está o decreto lei 111/2009 onde em se define quem é.

E quem são os seus membros?
Ora peguem lá... devo acrescentar que não ganham nada mal...

Divirtam-se, que eu vou rastejar para o meu canto, lavado em lágrimas e a pensar como é que chegamos a isto...