Erros intencionais? Ou é apenas burrice?

Não há uma única circunstância em que se fale de uma listagem de chamadas telefónicas revelada, que não descambe imediatamente nos media para um caso de "escutas".

E excepção parece ser o caso do famoso envelope 9. Nesse caso a PT teria fornecido em Excel a listagem de chamadas feitas por telefones da conta do Estado, com um filtro activo mas com todos os telefones dessa conta incluídos.
Assim, estava entre outros o telefone do presidente da República e os telefones de outras altas figuras do Estado.

Mas essa listagem dizia apenas o número de origem e o de destino, a duração a hora e data da chamada. O mesmo para os SMS.

Nunca em nenhum destes casos se teve acesso ao conteúdo dos SMS ou da conversa gravada, pelo que, chamar a isto um caso de escutas é no mínimo aberrante.
O mesmo aconteceu com Cavaco Silva quando se referia ao facto de um assessor seu ter sido visto a almoçar com uma figura do PSD e quando houve suspeita de intrusão no sistema informático da presidência. Mas esse caso passou a ser conhecido como o caso das "escutas".

No caso mais recente acontece o mesmo. Fala-se de escutas.
Não sei se isto é pura ignorância ou se é apenas um resquício dos tempos em que um tipo empoleirado num poste ligava os seus auscultadores num fio de telefone e escutava alegremente as conversas a decorrer.

Hoje as coisas já não são bem assim. Numa rede móvel as comunicações entre o telefone e a antena são encriptadas. Interceptar uma conversa nessas circunstância é verdadeiramente complicado e dispendioso.
Só pelo facto de ser um telefone móvel mesmo que se conseguisse decifrar o conteúdo da emissão era preciso estar ao pé ou do emissor ou do receptor.
Até na rede fixa que é hoje digital se passa o mesmo. Muitos dos operadores já usam VoIP o que quer dizer que não só é digital como a comunicação entre o telefone do cliente e a rede é encriptada e é uma comunicação de voz sobre IP. Fazendo um paralelo relativamente simplificado é como se fosse uma conversa no Skype.
Até os telefones sem fios que temos em casa deixaram de ser um mero emissor receptor em FM para passarem a ter encriptação DECT.
As intercepções têm de ser feitas centralmente. Numa plataforma especial que permite gravar as conversas entre os intervenientes.
Estas plataformas existentes nas operadoras são de acesso muito restrito e só mexidas por ordem judicial. A possibilidade de alguém (nos dias que correm) poder entrar nessa plataforma e criar um intercepção são verdadeiramente remotas. Por ter acontecido há uns anos, fechou-se a segurança dessas plataformas de maneira quase obsessiva.

A listagem de chamadas já não é assim. Está acessível nessas empresas a muita gente de forma perfeitamente normal. Uma pessoa do suporte tem acesso às últimas chamadas do cliente. Precisa de ter para o caso de o cliente apresentar uma reclamação. As próprias facturas detalhadas têm essa informação e ficam guardadas não só no email do cliente (quando enviadas em formato Acrobat) como podem ser reenviadas a seu pedido por se ter perdido a 1ª via.

Uma lista de chamadas é já de si bastante elucidativa. De tal forma que mesmo na facturação se pode pedir para mascarar número completo ou apenas um conjunto de dígitos (tipicamente 7). Isto para o caso de alguém que receba a factura em casa e não quer que o cônjuge ande a tentar perceber se há "amantes" envolvidos(as).

Da mesma forma que eu sei isto só de conversar com pessoas que trabalham no ramo, é obrigação de um jornalista sabê-lo. Uma vez que está a informar exige-se que junto das fontes habilitadas retire qualquer dúvida e informe de facto.
Mas não o fazem. Muitos porque são muito cheios de si e acham que sabem tudo. Outros porque percebem que o efeito de falar em escutas é muito maior do que se disserem "listagem de chamadas". Se a coisa ficar mais ou menos indefinida já se sabe que quem vê ou ouve irá acrescentar mais um pontinho para apimentar a coisa. 3 pessoas depois temos um caso de "escutas".
Já vi até o Prof. Marcelo dizer isto, sem sequer se preocupar em distinguir uma coisa da outra.

Não é que não seja grave obter ilegalmente uma listagem de chamadas. Mas comparar isto a escutas numa notícia é o mesmo que dar uma notícia de um acidente e dizer que houve 5 feridos com alguma gravidade ou dizer que houve 5 mortos.
Se a informação não é rigorosa e "informativa" não vale NADA. E de facto a nossa informação caracteriza-se por ser mais um chorrilho de opiniões jornalísticas do que uma informação com factos.
Mesmo quando os jornalistas não o fazem limitam-se a trazer "comentadores". São assim mais ou menos como as coscuvilheiras da aldeia. Nada sabem ao certo mas são especialistas em rumores e em "ouvir dizer". São também especialistas nas suas opiniões. O que é o mesmo que dizer que qualquer um com um minimo de cultura e discernimento poderia estar no lugar deles.
Uma opinião é uma opinião e como sabemos todos têm uma. Porque pagam a um qualquer asno com uma "agenda" pessoal par ir dizer as suas opiniões para a televisão é algo que me ultrapassa por completo. A utilidade disto é nula. Daqui retiro aquelas figuras de saber e estatura como um Adriano Moreira ou um Miguel Beleza ou os outros especialistas em Economia, Direito, Medicina etc. Mas o resto? O resto são "jornalistas" com opiniões. Vivem das opiniões. E ainda dizem que é difícil ganhar a vida neste país...

Aborrece-me especialmente na nossa informação que quando se entra em questões mais técnicas, se simplifique a mensagem porque se assume (ou se faz conscientemente) que o receptor da mensagem é burro e não merece mais qualidade. Ou pior ainda, se quer "orientar" o receptor da mensagem num determinado sentido, manipulando, omitindo, ou pura e simplesmente inventando informação para obter um resultado concreto.

Nunca estivemos tão mal informados com tanta informação à nossa volta. Perdeu-se quase completamente a seriedade e a objectividade nos media. Salvo raras e honrosas excepções ninguém parece estar interessado em ir ao fundo das coisas. É mais fácil ficar pela lambreta do Ministro ou pela mania que o Min das Finanças tem de falar pausadamente. Ou falar do caso de Sócrates a perguntar de que lado fica melhor do que analisar com algum cuidado o que foram as medidas implementadas ou anunciadas por ele que nunca deram qualquer resultado que fosse ou sequer que foram concretizadas.

Sócrates passa até ao lado desta questão da listagem de chamadas do jornalista. Foi durante o seu Governo feito por entidades tuteladas por si DIRECTAMENTE. Ainda não vi ninguém falar nisto nos media. Só os vejo tratar o caso como se fosse este Governo que tem alguma responsabilidade no assunto. Como todos os outros casos que têm vindo a lume o governo de Passos Coelho não tem feito mais que agachar-se com o saquinho de plástico na mão para apanhar a caca que os outros deixaram e não apanharam.

Aos media pede-se profissionalismo. Ética e algum trabalho de casa. Se tivéssemos que olhar e avaliar o desempenho da classe jornalística deste país nem 1% de Muito Bom se daria. Para se ser uma jornalista basta uma carinha laroca e umas perninhas jeitosas. No caso de ser homem é só necessário ser um palerma que começa por fazer exteriores e perguntas estúpidas. Qualidade do trabalho? O que é isso?

Isto parece ser extensível a todos os meios de comunicação. Foi no rádio que ouvi um jornalista dizer "o ministro das Finanças persiste em responder às perguntas". Persiste. Como se já estivessem fartos de o ouvir e queriam que ele se calasse.
Ou a mais recente campanha, aproveitando a tão proverbial dor de cotovelo nacional, para carregar os ricos com impostos.

Esquecendo-se de dizer qual é o escalão em que já estão os que ganham mais de 150 mil Euros. Em França é preciso 500 mil para pagar 44%. Cá é preciso 150 mil para pagar 49%.
Só ouvimos falar dos 2.5 ou 3.5% a mais. Ninguém diz que quem ganhe 150.000 Euros por ano, "devolve" ao Estado metade do que ganha. Não deduz um tostão. Como provavelmente já vive numa casa melhor deve ter uma continha de IMI de fazer chorar as pedras. Mas depois fala-se no património, especialmente o imobiliário, como se por acaso ele fosse isento de impostos.

Notem bem que os próprios media se referem aos muito ricos. Para eles um rico deve ser logo alguém que ganha 60.000. Provavelmente metade do que ganha um director dum canal de notícias por cabo.

Os verdadeiros ricos riem até doer a barriga com as intenções quase pueris desta corja de palermas que vai dos políticos aos jornalistas.

E se hoje temos uma classe política perfeitamente miserável, em muito se deve ao facto de a classe jornalística, ela também consideravelmente miserável, promover até à exaustão os "meninos" da sua simpatia. O caso de Sócrates é dos mais gritantes e teve as consequências que nós sabemos.

Não consigo quase ver noticiários, programas de comentário ou debates estéreis na TV. A náusea é demais.
Os órgão de informação de "massas" passaram a ser intoxicadores, manipuladores e completamente isentos de decência. Estamos a descer para o abismo Fox News. E estamos a descer a uma velocidade estonteante.