Hora de voltar

Estava a começar a achar graça a isto. Já me estava a habituar a esta forma de pensar de quase todo um povo.

A forma como nos enterramos sabendo que isso vai ser a nossa perdição, como atiramos o problema para a frente na esperança de nunca o chegar a apanhar.
A forma como quando uma pequenina coisa muda pensarmos que já está tudo resolvido.

Tem sido assim nestes últimos tempos.
Gastámos e endividamo-nos até não poder mais para nos deliciarmos com inutilidades ou para parecermos mais sofisticados ou até para fazer uma certa inveja aos vizinhos e amigos.
Sabíamos que isso ia ser uma catástrofe e que as coisas não iam continuar assim. As taxas de juro variáveis variam e os carros novos envelhecem. As casas que são propriedade dos bancos precisam de obras ao fim de alguns anos e todos os problemas que chutámos para a frente vão lá estar à nossa espera com uma dimensão um bocadinho maior..

Bradamos por cortes cortes e depois berramos porque os cortes incidem não só sobre o desperdício mas também em coisas que dávamos como fundamentais e adquiridas. A curteza de vistas e a incapacidade de ouvir o que têm para nos dizer faz com que todos os avisos que foram dados há 100 dias tivessem caído em saco roto. Todos pensavam, ou quiseram pensar, que tudo tinha acabado assim que tinham posto a besta fora do poder. Auto convenceram-se e agora estão aborrecidinhos porque estão enganados.

Mas neste planeta toda a gente parece viver bem com isso. Temos jovens indignados e precários a fazer bicha para o iPhone 4 ou seguramente para o 5, que passam fins de semana fora e gostam de sair "para conviver". Basta que haja um jogo de futebol em que a equipa favorita ganhe, e esse jogo pode ser ao Sábado, Domingo, Segunda, Terça, Quarta, Quinta ou Sexta Feira, e todos ficam contentes e se esquecem do buraco de trampa onde estão metidos. Alguns cavaram-no sózinhos, outros foram arrastados para ele pelos que o abriram.

Só que hoje descobri que estou num mundo paralelo. Toda esta gente que eu pensava que era meio louca e incoerente de repente mudou. Como isto é mais ou menos impossível eu assumo que de alguma forma vim dar a este mundo paralelo.

Hoje descobri que neste universo existe alguma sensatez e percebem que um 1º ministro que nos dá más notícias e tenta pelo menos ser sério e honesto merece algum reconhecimento e apoio. Aqui apreciam a cautela. No meu mundo adoravam o optimismo cego e meio aparvalhado. Só faltava regarem-se de gasolina e acender um cigarro com a convicção optimista de que tudo corre bem.

No universo onde eu estava preferiam vigaristazecos de meia tijela, com diplomas falsificados, teimosos e incompetentes. Mas, cheios de carisma. Eu por acaso achava que estariam cheios de outra coisa, mas pronto, aceito que lhe chamem carisma.
Nesse meu universo a maioria dos jornalistas cuja função é informar, portam-se como deficientes mentais e fazem perguntas imbecis aos entrevistados à saída de um qualquer evento. São insistentes, mal educados e completamente desprovidos de ética.
Portam-se mais como peixeiras ou como arruaceiros a lançar observações provocatórias aos entrevistados.
Comentam cenários sobre especulações.
Lambem as botas ao poder qualquer que ele seja. Gostam de se sentir bem dizendo que são "jornalistas" e deixar passar a ideia de que isso lhes dá uma espécie de poder de fazer ou desfazer carreiras e vidas.

na verdade, portam-se assim também neste universo mas o povo, esse sim, parece mesmo ter andado a fingir que era estúpido.

Por um capricho qualquer da fisica vim parar ao universo paralelo errado. Tudo parece igual, mas as pessoas não. Não todas, apenas algumas.

Vou tentar voltar par o meu mundo onde o povinho vota em pessoas como Sócrates, Isaltino, Felgueiras ou João Jardim.
Onde os gestores são uma desgraça e apenas sabem despedir pessoas quando as coisas estão mal. São incapazes de abdicar das suas mordomias, mas são capazes de despedir alguém que ganhe 450 Euros por mês.
Onde os sindicalistas preferem manter a sua coerência ideológica e ver um desempregado que lhes possa dar atenção do que um empregado que se esteja a cagar para o que eles defendem.


Vou voltar para meu universo. Já não entendo nada do que se está a passar