Incontinências verbais

Um problema que parece afectar muitos dos actores da nossa vida política.

Sobretudo muitos ex qualquer coisa que não tendo feito nada de exemplar, não conseguem manter-se calados nem sequer analisar o que foi a sua actuação perante circunstâncias semelhantes.

Mário Soares parece ser um desses casos.
Muita gente lhe atribui o facto de Portugal não ter descambado para um regime comunista no verão de 75. Aceita-se. Foi um dos participantes nesse que foi um movimento nacional.
Não fosse a resistência de todo o país à comunização galopante, especialmente o Norte do país, Soares sózinho não teria conseguido nada.
Mas não nos esqueçamos de Eanes e de outros militares moderados que ajudaram a por cobro à loucura que foi o período de verão de 1975 levada a cabo por um partido que hoje se reduz a um digito percentual e que mesmo em 1975 teve 12.46% dos votos de 91.6% dos eleitores inscritos.

A não ser este contributo, não percebo o grau de relevância que se dá a Soares no período que se lhe seguiu. Negociou uma entrada na CEE com concessões graves que vieram redundar na destruição dos sectores productivos do país. Em troca de dinheiro acabou-se com a agricultura e pescas por imposição dos parceiros da comunidade. Já dessa vez negociámos de mão estendida para entrar no clube dos "ricos". Empenhámos o nosso futuro nessa altura e logo a seguir com a chegada de dinheiro fácil durante os governos de Cavaco.

O problema de Soares é o de pensar que ser político é a coisa mais importante que se pode ser na vida. Que os técnicos são uns meros executantes e conselheiros de gente de mais alto gabarito e com uma alargada visão do mundo.
Para ele técnico é um termo depreciativo. Algo muito comum mesmo nas empresas em que o tipo que garante o sustento de todos é apenas um "técnico". Sem pinta, que veste mal e não sabe comportar-se num cocktail...

Nas sua cabeça deve imaginar-se a tomar decisões para o bem da humanidade tendo obviamente recursos ilimitados. Ser um grande político assim é extremamente fácil.
Mas o problema é que não estamos assim. As decisões que um político tem de tomar na situação presente têm de ser suportadas e corroboradas por técnicos.
E Vitor Gaspar não só fala do que sabe, como tem algo que faltava antes - prudência.

Com Sócrates as coisas não eram assim. Esse era um grande "político" diziam. Teixeira dos Santos dizia uma coisa e Sócrates por questões de "compromissos" fazia a contrária.
Por isso não consigo suportar Teixeira dos Santos. Mesmo que fosse um excelente técnico nunca teve o brio intelectual de dizer que não pactuava com a loucura que Sócrates lhe impunha. Manteve o lugar até ser desconsiderado completamente por aqueles que o usaram. Tivesse sido a ajuda pedida quando os juros chegaram a 7% como ele dizia e hoje teríamos uma dívida bem menor para pagar. As empresas que no entretanto alargaram os buracos a níveis inacreditáveis teriam ao menos sido travadas nessa loucura.

O resultado dessas decisões "políticas" está à vista. Não passa um dia em que a dimensão do buraco não alargue.
Hospitais, Estradas, Transportes, Educação, tudo falido.

E quando se fala de falência está a falar-se de dinheiro. E para isso não bastam decisões políticas como se o dinheiro fosse uma coisa virtual e inesgotável. Por isso um bom economista e um político prudente são fundamentais.

Soares acha isto mal. Chama ao ministro político ocasional. Isto, no meu entender, quer dizer que ele só é um aldrabão superficial ocasionalmente. Isso é bom mas seria melhor que nunca o fosse.

Soares por outro lado é um político a tempo inteiro. Não especialmente brilhante como se quer fazer crer. Não é nenhum Churchill, Adenauer ou Pompidou. É Soares. É o Duque de Nafarros.
Esta noção que ele tem de si ao por-se ao nível dos que construiram a Europa não só é quase risível como não passa dum delírio pessoal.

Não creio que fizesse melhor do que Sócrates ou do que Passos Coelho.
Aliás, a sua passagem pelo Parlamento Europeu mais não foi do que um prémio monetário por serviços prestados. A sua actuação no PE foi absolutamente nula.

Foi sem tirar nem por um político.
Um político à maneira "antiga" rodeado de benefícios bizarros e dispendiosos. Um generoso pagamento pelos anos de serviço ao país.

Ao menos Sampaio tem tido a virtude de não falar muito. Ficou com a pensão vitalícia e com as mordomias dadas aos ex presidentes e não fala demais para que não nos lembremos que foi ele a "por" Sócrates no poder.

De todos Eanes é o que me honra mais como Português.
Um homem que se soube impôr quando foi preciso, que depois de ser presidente estudo e evoluiu fazendo um doutoramento.
Eanes sim. Foi de militar corajoso a homem de cultura.
E é sobretudo contido. Não passa a vida a falar aos media para que não se esqueçam dele.