Uma nota de humor em tempos conturbados

“200 elementos vão abandonar” o Bloco de Esquerda e formar novo partido 

Apesar de não ter uma idade assim tão alta, lembro-me muitíssimo bem de forças políticas que estiveram na génese daquilo que é hoje o Bloco De Esquerda. Coisas como a AOC (Aliança Operária Camponesa), LCI (Liga Comunista Internacionalista), FER (Frente da Esquerda Revolucionária), POUS, UDP, PSR etc etc.
Eram, dada a sua expressão eleitoral verdadeiros comic reliefs nos tempos de antena para as campanhas eleitorais. Uns odiavam os outros porque uns eram fãs de Trotsky enquanto os outros eram fãs de Estaline. Fosse como fosse era de partir o coco a rir.
Com a a sua fusão no BE, estes grupos acabaram por ganhar uma respeitabilidade nunca atingida que culminou com os resultados eleitorais que lhes permitiam sonhar ser a 3ª força política do país.

Mas as últimas legislativas foram um enorme balde de água fria. Aquilo que era um voz dissonante e pouco convencional no Parlamento (Louçã) acabou por ser vítima do seu próprio mediatismo. Tornou-se parte do sistema. O seu discurso já é um pouco mais ponderado e realista e isso, dizem alguns dentro do bloco, é responsável pela derrota eleitoral de 2011.

Louçã já não se sai com propostas como as feitas pelo lider da "tendência" contestatária
O líder da Ruptura/FER defendeu que o BE deveria ter feito uma convenção extraordinária para debater os resultados eleitorais e também posições "mais audazes" em vários domínios, como na exigência do fim das portagens em todas as autoestradas, a suspensão do pagamento da dívida ou nas políticas de apoio ao emprego.
Louçã não anda muito longe disto, mas na verdade o nível máximo de imbecilidade já não pode ser atingido por alguém que quer ter alguma respeitabilidade política, sem correr o risco de ser olhado como mais um palerma que entre dois charros tem umas ideias políticas (e quiçá nem é entre dois charros, é mesmo durante um charro).

A suspensão do pagamento da dívida vinda de alguém como Louçã seria uma impossibilidade. Ele sabe que sem o acesso ao financiamento, o país entraria em colapso. Sabe o suficiente de Economia para perceber os efeitos colaterais de loucuras radicais.

Se Louçã voltasse a adoptar este tipo de posições, muito dificilmente poderia ter algum sucesso.
E teve sucesso porque a dada altura as pessoas sabiam que não gostavam já do PS e sentiam repulsa pelo PSD. As posições expressas pelo BE, ainda que utópicas na sua maioria, funcionaram como um refúgio atractivo para muitos.

Quando se percebeu que o BE afinal não tinha qualquer vontade de fazer parte da solução e quando se chegou a altura das decisões sérias e realmente importantes para o país, o BE voltou ao seu núcleo duro.
Perdeu votos. Houve gente que finalmente se decidiu por outras opções ou foi também vitima da abstenção (a velha máxima do "eles são todos iguais" e eu não quero saber mais disto).
A Mesa acusa a Ruptura/FER - que se integrou no Bloco já "depois da sua fundação" - de, durante uma década, ter ocultado as suas divergências, "aprovando as resoluções das Convenções que agora diaboliza". Nos últimos ano, "passou a afirmar divergências de fundo sob qualquer pretexto" e há exemplos: "Intervenções tão extravagantes como o apelo à constituição de brigadas para apoiar os talibãs no Afeganistão, ou apelo ao voto em branco nas eleições presidenciais", aponta o Bloco de Esquerda.

Parece que voltamos a ter os pitorescos.
A criação de brigadas de apoio aos talibãs é verdadeiramente fascinante para alguém que por outro lado defende a igualdade de direitos entre mulheres e homens e o direito ao aborto, só para citar duas pequenas coisas. Quanto à lei de Talião não me surpreende muito de gente que apoiou regimes como o da Coreia do Norte, ou Cambodja. Comparados com eles, os talibãs são uns rapazes inofensivos.

Já cá faltavam os cómicos da política que perante a risota que causam só sabem retorquir que os fuzilamentos ou a acção directa são o único meio de mudar a sociedade.

Quantos votantes perde o bloco e quantos ganha este grupelho logo se verá. A verdade é que a descida aos infernos da extrema esquerda radical parece ainda não ter acabado.

À falta de referências políticas de uma geração que anda pelos "vintes" apela-se ao indignados aos piratas aos anarcas. Mesmo sem haver uma matriz ideológica ou um ideal de sociedade, sabem que desta não gostam. Em qual concordam é que é uma chatice.
Não sei como estes fãs da liberdade reagiriam a um regime que a retira na totalidade. Ou então esperam estar do lado de quem a retira e não do lado de quem a perde.

No fim de tudo isto o que vai sobrar é um cadáver.
Arrastando-se entre actos eleitorais com meia dúzia (ou menos) de gatos pingados na AR.
Um dia virá em que para serem notados apelarão à formação de brigadas para lutar contra a ocupação Americana da base das Lajes.