A politização das coisas. De todas as coisas

Já estamos habituados a ver todo e qualquer assunto que se discute a levar com um carimbo político. O aborto é de esquerda, prender um criminoso é de direita (a não ser que seja um criminoso de direita o que faz com que prender um criminoso seja de esquerda), o lucro é de direita , ser bonzinho e dar dinheiro aos pobres é de esquerda, dizer a alguém que trabalhe é de direita e por aí fora.

Talvez porque alguns não consigam conceber que as coisas possam existir numa esfera completamente diferente da política, precisam de ligá-las a uma ideologia.
Como se na aplicação prática houvesse alguma característica que as ligasse a uma ideologia.

O caso mais recente parece ser a clivagem entre os apoiantes do acordo ortográfico e os seus detractores. Entre os quais se inclui Vasco graça Moura.

Parece que de repente o acordo é de esquerda e que aqueles que não o querem adoptar são de direita. E isto talvez seja porque foi durante os Governos de Sócrates que essa aberração foi aprovada.

O acordo não é de esquerda nem de direita. O acordo é uma merda e ponto final.
É incoerente, viola regras básicas da língua e transforma-a uma amálgama de disparates.
Como se chamam os que nasceram no Egito? Egicios?
E se eu disser "os fatos foram provados" sou alfaiate ou juiz?

A língua tem regras. E a nossa através de um acordo dificilmente defensável, vai ter essas regras violadas de tal forma que palavras derivadas de outras vão ser irreconhecíveis.
As razões deste acordo prendiam-se com uma maior facilidade de "vender" obras escritas em português nos outros países de língua portuguesa. Uma razão económica e de viabilidade da nossa língua que talvez devesse ser repensada.
Como é que os islandeses se safam com as suas publicações? Ou os finlandeses? Vão por-se todos a falar em Sueco para poder expandir o mercado? Não. Claro que não.
E entre as razões que poderiam apontar decerto estaria a génese da sua língua e por arrasto de toda a sua cultura.

Quando Graça Moura ou Sousa Tavares são contra o acordo, não o são por imobilismo ou porque são a nova geração de defensores dos velhos hábitos.
São-no porque sabem da língua muito mais que o comum cidadão que a destrói, e que sejam qualquer quais sejam as regras a destruirá na mesma.

Mudar a forma de escrever (e por arrasto, de falar) por decreto é absurdo. E não estamos a falar de um estudo aturado e um decreto emanado por alguém sapiente e capaz. Estamos a falar de regras mal amanhadas e impostas por gente incompetente.
Mesmo assim isso não faz com que o acordo seja de esquerda. Só faz com que o acordo seja o que é - uma merda.

Ouvir os partidos de esquerda atirar-se à jugular do 1º ministro por causa de Graça Moura e da sua circular interna no CCB, é um aproveitamento patético da situação com dividendos políticos em mente.
Mas a única coisa que pretendem com isto é ser os "mete nojo" do costume. Nada em prol das soluções e tudo em prol dos problemas. As inutilidades demagógicas do costume.



Aproveitar este tipo de situações para questionar a não recondução de Mega Ferreira é como dizem os ingleses "grasping at straws". É um dos melhores exemplos de como se perde tempo no parlamento a discutir parvoíces.